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Meu pai deixou uma carta para ser lida depois da sua morte.
Nela ele usou uma expressão que embora muito triste mergulhada em muita poesia.
“- Sou um homem de Raízes Indelicadas”.
Eu já comentei por aqui e também nos agradecimentos do
romance – O Clube do Salto – que herdei o dom de escrever do meu pai. Ele
sempre escreveu muito bem, mas não chegou a ter nada publicado. Estava em seus
planos e sonhos publicar um livro, o que não deu tempo. Isso faz com que eu me
culpe, porque embora tenhamos trocado várias conversas sobre o assunto, todas
sem nenhum sucesso, eu poderia ter empenhado mais esforço em ajuda-lo a
realizar o seu sonho. Essa foi mais uma lição que a morte dele deixou: todo
esforço enquanto ainda há vida.
Fiquei pensando muito sobre essa expressão tão profunda e contundentemente
delicada.
Indelicada mesmo é a vida que não nos dá a real dimensão do
amor que sentimos, a não ser depois que perdemos.
Então, resolvi escrever sobre isso:
“Raízes Indelicadas”
Indelicada essa vida que não acerta nossos ponteiros com o
relógio de quem amamos.
Indelicada a morte que, embora certa, não nos prepara para a
perda e nos torna capengas, arrancando um pedaço do que temos de mais precioso,
o amor.
Indelicada também as pessoas que não se deixam amar, se
esquivam, se enganam e se afastam como se temesse mais o amor do que a dor.
Indelicada a fraqueza que nos faz desistir sabendo que
posteriormente iremos nos arrepender de não termos tentado mais.
Indelicada a dor que fica no peito porque não nos deixamos quebrantar, lutamos as lutas erradas e baixamos a guarda para o inimigo.
Indelicada a experiência que pra nada serve se não nos tornar
pessoas mais humildes, que falam menos e dão mais exemplos. Que apesar dos
apelos não se enveredam por caminhos tortuosos.
Indelicada a saudade que não nos deixa dormir, que na madrugada
vem testar nossas forças e a nossa dor.
Indelicada é a lição que aprendemos na marra, sem idade e
sem maturidade para carregar.
Indelicada é a caminhada que prossegue anunciando que outras
perdas virão.
Indelicada é a vida que é um ciclo e que nos faz sobreviver e retomar
a maioria das futilidades que hoje tanto condenamos.
Indelicadas raízes?
Não.
Indelicada é a vida que
nos furta a própria vida.
2 comentários:
Também considero a vida indelicada, pois ela nos dá e nos priva do que mais amamos.
Bjs no coração
Sou filha de um homem de raízes indelicadas, mas que deixou em minha alma muita, muita delicadeza... Saudades!
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